3 de outubro de 2015

Momento

(Imagem Google/desconheço a autoria)

O momento das carícias
insinuara-se entre eles, 
metera-se entre os lençóis, 
não sabia dizer explicitamente
o que queria, mas fizeram-lhe a vontade.

José Saramago
A Caverna



12 de junho de 2015

Pele

A. Birto


Quero uma tarde eterna de mar
e navegar por entre a pele 
da tua alma sem rumo.

Maria de Lurdes Melo
Não Gritaste Por Mim, Meu Amor...



Se partires, não me abraces – a falésia que se encosta
uma vez ao ombro do mar quer ser barco para sempre
e sonha com viagens na pele salgada das ondas.

O Canto do Vento nos Ciprestes



2 de junho de 2015

Dor

Haleh Bryan

Os troncos das árvores doem-me como se fossem os meus ombros
Doem-me as ondas do mar como gargantas de cristal
Dói-me o luar como um pano branco que se rasga.

Sophia de Mello Breyner Andresen
Antologia /  Círculo de Poesia


A dor de um fruto tombado, 
é isso que eu sinto. 
Jesusalém






3 de maio de 2015

E era por ti

Ewa Brzozowska


Acreditei que se amasse de novo
Esqueceria outros
Pelos menos três ou quatro rostos que amei
Num delírio de arquivística
Organizei a memória em alfabetos
Como quem conta carneiros e amansa
No entanto flanco aberto não esqueço
E amo em ti os outros rostos.

Ana Cristina César
Inéditos e Dispersos

E te esperava, e te chamava,
e entre os caminhos me perdi.
Foi nuvem negra? maré brava?
E era por ti!

Canção a Caminho do Céu


22 de abril de 2015

Noite

Pinterest


Não consigo dormir. 
Tenho uma mulher atravessada
entre minhas pálpebras. 
Se pudesse, diria a ela que fosse embora;
mas tenho uma mulher atravessada em minha garganta.

Eduardo Galeano

Mujeres. Siglo XXI, España, 2015

 Então, convicto, ouço teu nome,  
única  parte de ti que não se dissolve
e continua existindo, puro som.
Aperto… o quê?   a massa 
de ar em que te converteste
e beijo, beijo intensamente o nada.

Aparição Amorosa




16 de abril de 2015

Água

So Hing-Keun-Corbis


Traz de novo, meu amor,
a transparência da água
dá ocupação à minha ternura vadia.


Mia Couto
Saudade / Raiz de Orvalho
Amor é o que chamo mar,
é o que chamo água.

 Linha d'Água



27 de novembro de 2014

Pele



- Qual o instrumento musical favorito?
- A pele.

Zack Magiezi
E não desejo outro ofício 
em que me ocupar.

Exercício


13 de outubro de 2014

Longas estações

Katia Chausheva



Não sabes então que me amas, amas muito mais que podes saber? Amas mesmo sem o socorro da tua consciência. E, se não me amas com a paixão do meu amor, te ensinarei novamente a amar-me. Não te peço tempo, dias, horas.
Sou mulher de longas estações.


Intimidades. Antologia de Contos Eróticos Femininos.


23 de setembro de 2014

Dentro de mim faz sul





quero reaprender o amor na respiração das tuas mãos 

quero-me sentado nas pálpebras quietas do teu olhar

quero me goiabar em ti, caroço e casca, verme e moço, seiva e corpo

tu – minha noite redonda

minha madrugada mulata.



Dentro de Mim faz Sul



3 de julho de 2014

Vida


a manh'ser


Eu sou o caule 
dessas trepadeiras sem classe, 
nascidas na frincha das pedras: 
Bravias. 
Renitentes. 
Indomáveis. 
Cortadas. 
Maltratadas. 
Pisadas. 
E renascendo.

Minha Cidade
A minha vida é como
se me batessem com ela.

Intervalo Doloroso/Livro do Desassossego


25 de junho de 2014

Blue

Fine Art America


Não te esqueças de, ao sair,
deixar a porta aberta.
Podes perder a chave
e não entrar.
Ou podem roubar-ta,
o que é pior.
Porque são numerosos
os ladrões do azul.

Albano Martins
Escrito a Vermelho

Consegues imaginar o céu sem o azul?
É assim que me faltas.

6 de junho de 2014

Espera

P Malkievicz



Não uma e meia nem sete nem quatro,
trinta e oito da madrugada,
duzentas e onze da manhã,
e uma escuridão infinita.

António Lobo Antunes
Eu Hei-de Amar uma Pedra

Horas, horas sem fim,
pesadas, fundas,
esperarei por ti
até que todas as coisas sejam mudas.
Até que uma pedra irrompa
e floresça.
Até que um pássaro me saia da garganta
e no silêncio desapareça.

Eugénio de Andrade
Espera



8 de maio de 2014

Amor




O amor nos suspende, nos arranca de nós mesmos e nos joga no estranho por excelência: outro corpo, outros olhos, outro ser. E é só neste corpo que não é nosso e nessa vida irremediavelmente alheia que podemos ser nós mesmos. 
Octavio Paz
O Arco e a Lira

1 de maio de 2014

Água



Falar de ti
é falar de tudo o que passa
no alto dos ventos
na luz das acácias
é esquecer os caminhos
apagar o enredo
é pensar as formas do branco
como teu corpo numa praia
branda e azul
tua pele não retém as horas
escorres, liquida
sonora

Francisco Alvim
Exemplar Proceder, 1974



Desconheço a autoria da imagem



17 de abril de 2014

Te sei

Rui Molefas



Te sei. Em vida
Provei teu gosto.
Perdas, partidas
Memória, pó.

Hilda Hilst
Poesia XXIX (Te Sei)

Não sei de amor senão o não ter tido
teu corpo que não cesso de perder.


Não Sei de Amor Senão